Quem gosta de manteiga se alegrou com recentes notícias, publicadas em jornais, afirmando que gordura saturada não é tão ruim quanto se imaginava.
Por outro lado, essas informações que “reabilitam” a manteiga vão contra diversas recomendações e deixam de fora várias nuances.
Mas afinal, qual é a verdade sobre a gordura saturada?
A Organização Mundial da Saúde aconselha que o percentual de calorias proveniente dela não ultrapasse 10%.
O argumento é que a gordura saturada aumenta a quantidade de colesterol ruim no sangue, apesar de também aumentar o do tipo bom.
O colesterol ruim entope artérias e pode levar a um infarto ou AVC. No entanto, testes com estatinas mostram que essas drogas, que diminuem o colesterol, podem reduzir o risco de ataque cardíaco.
Confusão?
Quando o assunto é nutrição, obter provas confiáveis é sempre uma espécie de pesadelo.
Alguns estudos se baseiam em questionários que perguntam o que as pessoas comeram no ano anterior, para então ver o que acontece décadas depois.
O problema é que muita gente tem dificuldade para lembrar o que comeu no dia anterior, quem dirá um ano atrás. Além disso, os hábitos alimentares mudam muito com o tempo.
E não seria lá muito antiético trancar pessoas e fazer experimentos com suas dietas por décadas para ver se elas terão um infarto.
Por isso, as provas acabam sendo uma colagem de resultados de diversos estudos, que dá uma impressão geral de que a gordura saturada é ruim.
A agência Public Health England, do Departamento de Saúde do Reino Unido, que aconselha as pessoas a cortar gordura saturada, diz que um dos artigos-chave em que a recomendação é baseada é uma revisão de 15 testes clínicos que mudaram as dietas de mais de 59 mil pessoas por pelo menos dois anos.
Mas até isso é um indicativo do motivo da possível confusão sobre a gordura saturada.
O trabalho não mostra impactos em mortes por doenças cardíacas ou outras causas. E conclui que cortar gordura saturada e substituí-la por carboidratos ou proteínas não faz diferença nos riscos.
A nutricionista-chefe do Public Health England, Alison Tedstone, afirma que gordura saturada é de fato ruim, mas que é justo dizer que “às vezes a questão da gordura fica simplista demais”.
“Os dados mudaram um pouco ao longo dos anos por causa de novos estudos que surgiram. E há que se considerar diferenças sutis, como se estamos falando em, poli ou carboidrato integral.”
“Concordo que é inapropriado dizer para a população aumentar seu consumo de carboidrato sem pensar sobre quais carboidratos são esses.”
O conselho dela é que as pessoas cozinhem com óleo de girassol, em vez de manteiga, e que usem margarina com pouca gordura.
A redenção da manteiga?
Alguns pesquisadores, no entanto, já argumentaram que até isso está errado e que manteiga e outros alimentos ricos em gordura saturada fazem parte de uma dieta saudável.
Um estudo feito em 2014 pela Universidade de Cambridge, do Reino Unido, ganhou repercussão após concluir que não há “evidências conclusivas” para as recomendações de cortar gordura saturada.
Foi essa análise que levou à avalanche de notícias dizendo que a manteiga “está de volta”.
“Isso é uma simplificação exagerada, nunca dissemos isso”, esclarece uma das pesquisadoras, Nita Forouhi, da unidade de epidemiologia da Universidade de Cambridge.
A revisão mostrou que não há uma relação significativa entre a quantidade de gordura saturada, gordura monossaturada ou um tipo de gordura polissaturada e doenças cardíacas.
Mas Forouhi afirma que é preciso focar mais não naquilo que deve ser cortado, mas pelo que deve ser substituído.
O estudo não pôde avaliar esse aspecto.
Segundo a especialista, a gordura saturada virou um “debate muito, muito reducionista”. Ela alerta que as pessoas “devem ser cuidadosas sobre dar mensagens simplificadas demais”.
Forouhi, porém, está na linha de frente de uma pesquisa que pode transformar o debate sobre a gordura saturada e trazer algumas delas de volta à mesa.
Houve um tempo em que médicos pensavam que todo o colesterol era ruim, até que descobriram que há o bom e o mau colesterol.
Agora, há uma percepção crescente de que nem toda gordura saturada é igual e que há provas crescentes de que algumas podem ser benéficas.
“Nossas novas descobertas também podem ajudar a esclarecer as conclusões de estudos que dizem que alguns tipos de laticínios podem diminuir o risco de diabetes e doenças cardíacas”, diz a pesquisadora.
Veredito
Mas então, as notícias estavam certas? Queijo, iogurte, leite integral e manteiga devem permanecer no cardápio?
Forouhi diz que isso é perigoso pegar os primeiros resultados da pesquisa para afirmar coisas do gênero.
“Não podemos supor que os efeitos benéficos de laticínios vem apenas do ácidos graxos saturados ‘bons’, já que todos os alimentos contém uma combinação de ingredientes.”
Ela alerta que há uma “ligação forte” entre manteiga/gordura saturada e mau colesterol, e que outros estudos deveriam ser feitos com tipos específicos dessa gordura.
Especificamente sobre a manteiga, a especialista diz que os estudos mais científicos não a incluem dentro da definição de laticínio.
“Enquanto as pesquisas ainda estão sendo feitas, acho que não devemos sair mudando nada”, diz ela sobre as recomendações.
“É muito cedo para dar ao público a impressão de que há uma licença. A pesquisa preliminar é animadora, mas não só definitiva. Não dá para dizer que a manteiga está de volta.”
Fonte: Noticias Terra