O pai da representante comercial Caroline Figueiredo, de Ribeirão Preto (SP), lutava contra um câncer e dependia de um exame fundamental para dar sequência ao tratamento. O plano de saúde somente pagou pelo procedimento de R$ 3,7 mil depois que a família do paciente acionou a Justiça.
Apesar do caso solucionado, um dia antes de a família recorrer a meios particulares, ficou o desgaste emocional.
“Foi muito difícil. Esse exame era essencial no tratamento do meu pai para dar continuidade. Nós fizemos rifa, contamos com a ajuda de alguns amigos e graças à Justiça a gente conseguiu liberar sem ter que pagar nada no exame”, afirma Caroline.
Casos como os da representante comercial não são únicos e somam 30.117 ajuizados somente em 2017 em todo o Estado de São Paulo contra planos de saúde, segundos dados apurados pela EPTV, afiliada da TV Globo, com o Observatório da Judicialização da Saúde Suplementar da USP.
Número que cresceu 329% desde 2011 e garantiu à saúde suplementar uma incidência de conflitos levados à Justiça proporcionalmente superior ao do Sistema Único de Saúde (SUS). Em 90% dos casos, com causa ganha aos clientes.
“Isso deixa claro que os convênios estão ferindo regras ao consumidor. Ou seja, essa judicialização, além de prejudicar o judiciário com o abarrotamento na distribuição de ações que não havia necessidade, que poderia ter sido discutido no mérito administrativo, trará também prejuízo ao consumidor, que está pagando por um atendimento médico de qualidade e não está recebendo”, afirma o advogado Carlos Manella.
Recusa e reajuste
Segundo o levantamento, em 40% dos processos, as ações foram motivadas pela recusa de cobertura por parte dos planos de saúde a determinados procedimentos.
“A gente se sentiu lesado, porque ele estava precisando, ele tinha que fazer o exame. A gente ficou muito mal, por isso que a gente começou a correr atrás. Eu acho que eles [planos de saúde] já fazem isso sabendo que a pessoa vai correr atrás, vai dar um jeito, porque precisa. Você não quer ver nenhum parente seu passando por isso”, relata Caroline.
Especialista na área, o advogado Carlos Manella, de Ribeirão Preto, confirma que as recusas para exames e cirurgias são as situações mais recorrentes. “Nesse caso, nós orientamos os clientes a impetrar uma ação judicial e liminarmente garantirmos o acesso a esse direito”, diz.
Ele conta já ter enfrentado o mesmo problema por experiência própria há quatro anos, quando precisou de um exame essencial para um tratamento de câncer. Além do procedimento gratuito, o advogado conseguiu indenização por danos morais.
“Em muitos casos o dano moral é fixado em um valor muito maior às vezes duas a três vezes maior do que o próprio procedimento determinado e solicitado pela junta médica”, analisa.
Outra situação recorrente, segundo ele, se refere às pessoas que perderam o emprego e tiveram os planos cancelados. Segundo o advogado, apesar de ser comum a prática por parte dos planos de saúde, há jurisprudência favorável ao entendimento de que o cliente pode continuar a ser conveniado nas mesmas condições desde que arque com as parcelas.
“Ele [o trabalhador] tem um lapso temporal de até 12 meses para reclamar essa continuidade.”
Quando não reclamam dos procedimentos rejeitados ou da suspensão dos planos, os clientes levam à Justiça casos de reajuste considerados abusivos. Segundo o coordenador do Procon em Ribeirão, Feres Junqueira, essas reclamações são muito comuns.
“Varia bastante, mas a grande maioria versa em relação a reajuste e negativa de exames ou procedimentos pelo plano de saúde”, confirma.